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domingo, 23 de agosto de 2009

Imagens Também Cortam

Há pouco, andei folheando literatura infantil em biblioteca de escola para matar tempo vago, curiosidade ou saudade mesmo; talvez para tentar me dissuadir que os 35% de analfabetos funcionais do país não são por culpa de políticas educacionais desinteressadas e sucateadas mas por uma possível deficiência de leitura ainda na infância, o que obviamente não é verdade.
O que me impressionou não foi o texto escrito do material que encontrei mas suas ilustrações. Talvez nem capacidade teórica de analisar literatura infantil tenho (não possuo formação para desempenhar tal ofício), o que me obrigou a iniciar este texto (dêem nome a isto, leitor! Que tipo de texto é esse?) em primeira pessoa, deixando claro que trago aqui nada mais que impressões.
A questão é que livros recentes continuam estereotipando figuras da nossa sociedade. É incrível como personagens ligadas ao mal, como bruxas e vilões, são associadas à feiúra. Verrugas na testa, roupas rasgadas e esteticamente distorcidas, cabelos esganiçados, referências à altura - gigantes são sempre ruins (eu protesto!).
Considerando nossa diversidade étnica, já evidenciada na sociologia (aqui no Brasil) desde as primeiras décadas do século passado, principalmente através de Gilberto Freyre, as ilustrações em algumas obras infantis permanecem alienadas. O negro, o índio, o amarelo ainda exercem função de coadjuvantes na ação das histórias, quando não associados à imagem da deselegância. A princesa (ou príncipe), se não segue o protótipo da raça ariana, associa-se mais uma vez à idéia de beleza e bondade, como se as duas coisas caminhassem juntas.
Talvez a mais irônica das figuras seja a do ladrão; sempre pobre, sujo, sem dentes, roupas rasgadas e de preferência feio. O que responder à criança que disser que o bandido do Jornal Nacional não se parece com o do livrinho da escola? Coitadinha, vai perceber que criminoso no Brasil usa terno e gravata. E pior, o que falar se ela associar o ladrão da aula de leitura ao trabalhador que presta algum serviço em sua casa ou ao pai da coleguinha que está chegando da lida com a sacola de pão?
Talvez daí possamos compreender porque a beleza é constantemente associada, pelos já crescidinhos, ao caráter ou até mesmo à competência profissional. Grande parte do comércio é extremamente preconceituosa em se tratando de estética; em ofertas de emprego (principalmente para mulheres) não é incomum observarmos o “de boa aparência”, ou seja, cumprindo o padrão de beleza vigente em novelinhas, programas infantis ou de auditório e ilustrações dos livros de criança.
Ser bonito ou feio (o que acredito estar nos olhos de quem vê) não deve ser associado ao que é bom ou ruim. Gostos são heterogêneos e preconceitos não são transmitidos só por palavras mas por gestos e imagens, principalmente ilustrações de livros infantis, que são direcionadas a um público em plena formação no que tange a visão de mundo.

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