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sábado, 29 de agosto de 2009

Gerundismo

Há muito uma utilização do português vem me chamando a atenção, não por acreditar que irá prejudir ou melhorar o idioma, já que desde os tempos da Ribeirinha a língua vem servindo muito bem a seus usuários e esse papo de que ela está acabando ou piorando não vem de hoje.
Antes que o leitor mesmo que mentalmente me esbofeteie, crendo com razão que toda esta minha divagação lembra-o ainda mais dos produtivos discursos eleitoreiros (como se não bastassem os carros de som e o horário gratuito), afirmo que o que me vem chamando a atenção é o uso do gerúndio – forma nominal do verbo terminada em “-ndo”, como pegando ou fechando.
Ligado tradicionalmente à idéia de que uma ação ainda está sendo executada, o gerúndio tem sido usado de maneira curiosa por sua ocorrência em contextos antes não vistos. Por exemplo, na frase “Estarei entregando jornais pela manhã”, não há nada de diferente dos usos gerais dessa forma verbal, pois a entrega de jornais, neste caso, não é uma ação rápida, ocorre aos poucos. Mas no caso de “Estarei enviando o email em breve”, o verbo enviar já não é durativo (neste contexto), deveria ser instantâneo. Esta utilização excessiva é chamada de gerundismo.
O uso de gerúndios em “enviar, providenciar e decidir” é fundamental em discursos do famigerado telemarketing (isso mesmo, leitor, aquela criatura que te interrompe o almoço para enfiar-lhe goela abaixo um cartão de crédito ou aquele sotaque diferente que gasta 2 horas do seu domingo e não resolve o problema mais simples do seu celular) e a estratégia usada é justamente acrescentar a estes verbos a idéia de um tempo durativo, o que diminuiria a responsabilidade de uma promessa ou até atenuaria os nervos do injustiçado consumidor, ávido pela solução imediata de seu problema.
Podemos perceber como é menos comprometedor para uma empresa de telefonia, por exemplo, afirmar que um funcionário “estará entrando” em contato com o cliente do que “entrará” ou “irá entrar”. Nos dois últimos casos, seria muito mais provável o consumidor perguntar “Quando?”.
Se um aparelho de celular apresentar um defeito, observe as seguintes possíveis respostas de um atendente: I- “Vamos estar conseguindo um novo aparelho.” ou II- “Conseguiremos um novo aparelho.”. Qual das duas representaria uma solução rápida e objetiva do problema? Enquanto I indefiniria a data, o momento de entrega do celular, II fatalmente viria seguida de “Que dia?”, “Quando?”, etc.
Muitos afirmam que o gerundismo teria vindo ao Brasil de empréstimo da língua inglesa, através de manuais (traduzidos literalmente) destinados àlgumas empresas mas ainda não há nada de científico nesta hipótese. O que podemos assegurar é que o uso do gerúndio em verbos cuja ação não denota sentido durativo (“dar” um tiro, “escorregar” no piso, etc) é fundamental para alguns setores comerciais e sua função é indefinir a data da realização de algum serviço ou ação em geral.

3 comentários:

  1. Giu, como sempre, seus textos são muito bem elaborados, uma estrutura perfeita e melhor ainda, com uma crítica bem delineada a tudo!Ainda vou escrever como você!Abração do amigo!Burgão!

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  2. é por causa desse gerundismo que um parlamentar, desses que se importam com pequenos detalhes - o que considero melhor do que a preocupação com o próprio bolso -, quis executar o gerúndio. quer dizer, ele quis acabar com o uso do gerúndio nesses verbos. só não sei até hoje qual seria a pena para o sujeito que gerundiasse...

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  3. Eu vou estar concordando!

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